O luxo do lixo


Reluziu... É ouro ou lata

Formou a grande confusão
Qual areia na farofa
É o luxo e a pobreza
No meu mundo de ilusão

Xepa de lá pra cá xepei
Sou na vida um mendigo
da folia eu sou rei

Sai do lixo a pobreza
Euforia que consome
Se ficar o rato pega
Se cair urubu come

Vibra meu povo
Embala o corpo
A loucura é geral
Larguem minha fantasia
Que agonia... Deixem-me
Mostrar meu carnaval

Firme... Belo perfil!
Alegria e manifestação
Eis a Beija-flor tão linda
Derramando na avenida
Frutos de uma imaginação

Leba - laro - ô ô ô ô
Ebó lebará - laiá - laiá – ô

Reluziu...

Foi no carnaval de 1989 que no enredo da Escola de Samba "Beija-flor": “Ratos e Urubus larguem a minha fantasia”, que o carnavalesco Joãozinho Trinta, disse que do lixo saía a nobreza e que o pobre não gosta de miséria, lançou assim, a máxima “Pobre gosta de riqueza, quem gosta de pobreza é intelectual”.

Passados quase 20 anos, temos a certeza que o lixo é muito mais que restos não consumidos e inutilizados pelo homem e que a reciclagem além de reduzir o custo de uma nova produção, também diminui o impacto da poluição lançada no meio ambiente. Além do mais, o Brasil por ser socialmente desigual, plásticos, metais, vidros e papéis são materiais geradores de fonte de renda.

O nosso lixo é nobre quando também participa da constante busca por fontes alternativas na geração de energia; descobriu-se que os restos orgânicos são fonte de energia limpa e renovável, uma possível solução no crescimento desordenado de lixões e aterros sanitários, como também a não emissão de gases poluentes para a atmosfera. Como isto é possível?

Pessoal, eu quero ser otimista. Se Louis Vitton, Cartier, Tiffany, Piaget, Beaume&Mercier, Vacheron Constantin fazem bons negócios e planejam investir muito no Brasil, porque “Brasileiro gosta de luxo”, porque eu, brasileira, não posso explanar sobre o que eu acho deste 'luxo' e o que os empresários e os gestores públicos fazem em prol do meio ambiente? Deixa ver, mas não é somente por modismo e preocupações com o futuro; o lixo é muito caro e qualquer cidadão político que se preze quer ter uma usina de reciclagem e compostagem de lixo. Esqueceram da Máfia do lixo?

Mas vamos falar de trabalho sério; a Usina verde localizada na Ilha do Fundão, aqui no Estado do Rio de Janeiro, vem funcionamento desde 2004 em caráter experimental, utilizando tecnologia desenvolvida pela UFRJ em um empreendimento privado que recebe diariamente 30 toneladas de resíduos sólidos, vindos do aterro sanitário da Comlurb, no bairro do Caju.

Nesta unidade são seprarados os resíduos que podem ser reutilizados ou reciclados e o restante é incinerado em uma caldeira de recuperação de calor instalada no forno. Este processo de incineração diminui muito o volume de lixo, não desperdiçando manancial de material orgânico que também pode ser reaproveitado.

O gazes ácidos resultantes desta combustão são lavados com água alcalinizada, numa reação que transforma gases em sais minerais. 90% do peso do lixo é transformado em energia elétrica suficiente para abastecer 2.300 residências, com um consumo médio de 200 kW/ mês.

Essa energia através do lixo é considerada “subproduto” dentro do processo de destinação correta do lixo urbano, não sendo ainda um destino ideal para o lixo e não podendo ser comparada com hidroelétricas e termoelétricas, que possuem função exclusiva de geração de energia. No entanto dentro das políticas públicas de gestão limpa (redução, reciclagem e reutilização) esse tipo de sistema é melhor que os lixões e os aterros sanitários sem tratamento prévio.

A população contribuiria em muito neste processo, se houvesse uma separação prévia dos lixos – lixo seco do lixo úmido (orgânico) , que seriam feitos na origem e já com destinações diferentes; Após essa coleta seletiva de reciclagem, o material seco iria para as usinas de reciclagem, onde passaria por esteiras abertas com decomposição aeróbica, sem proliferação de vetores ou odores, resultando em adubo orgânico de ótima qualidade. A parte úmida do lixo que tem decomposição anaeróbica, iria para as estações de compostagem e biogestores, onde seriam produzidos os gases para geração de energia.

A população deve exigir uma melhor destinação do lixo, além das 'migalhas' que caem no chão de suas casas. Eu olhei o site da Secretaria de Estado do Ambiente do Rio de Janeiro e lá eles garantem que junto ao Ministério das Cidades, existe um projeto de elaboração do Plano Diretor de Resíduos Sólidos da Região Metropolitana e construção de aterros sanitários regionais que atenderão os municípios. E que para a erradicação dos lixões em todo o Estado do Rio de Janeiro, também foi criado um grupo de trabalho para analisar a destinação final dos resíduos sólidos da Região Metropolitana e a destinação dos investimentos. Investimentos do PAC...que não sejam apenas cabides de emprego ou mais um orgão para desvio de dinheiro público.

Na melhor compreensão da tag meme - Um meme é uma idéia que se espalha como vírus e que voluntariamente é reproduzida pelas pessoas, independente de indicações e tals - Quando li o post do Júnior Escalafobético falando do que era para ser lazer e que se transformou em 'ação de limpeza', achei oportuna a discussão e outras pessoas também acharam, como Carlos Jr. do Cejunior, a Flávia do Fotografando a vida, Luci do Hippos e o Cirilo Veloso do Simples Coisas da Vida que voluntariamente levantaram a questão em seus bloguinhos e que eu agora trago ao "luz".

A questão é: quanto dinheiro você gasta para produzir lixo?

[update] - Na próxima quinta-feira, dia 30, a Secretaria do Meio-ambiente do Estado de São Paulo promove em todo o Estado, um mutirão para coleta de lixo eletrônico. São 372 cidades cadastradas, somando 2.162 pontos de coleta para recolhimento de pilhas, baterias e celulares. Saiba os locais listados para coleta e participe!
Em algumas cidades do interior a coleta já começou. Campinas recolheu até agora 4 toneladas de material, o que demonstra que as espectativas de 10 toneladas para todo o Estado será superada. Todo o lixo recolhido será enviado para a Suécia e Bélgica, lugares onde existe tecnologia capacitada e apoio logístico da GM&Clog [saiba mais] e saiba também os lugares que funcionam para coleta o ano todo. Que esta idéia se espalhe pelo resto do país!

Baile de Formatura [update]

formatura
Eu não sonhei
que você estava linda.
Eu realmente fui ao baile
e vi você de relance, linda,
de uniforme de normalista,
e seus olhos eram olhos
de uma mulher enamorada,
parecida com a Malu Mader.
Sentindo frio em minhalma,
procurei o bar
p’ra tomar cuba-libre e coragem.
Quando voltei pro salão
você não estava.
Tinha casado e mudado.
Ainda havia flamingos,
viagens sentimentais,
encantamentos, convites,
damas apaixonadas,
sofisticadas e vagabundas,
a quem amei, mesmo sabendo
que isso não pode ser amor.
Não adianta me chamar
de irresponsável.
Eu estava me sentindo um tolo

por querer você.

Ainda assim, tive luas azuis,
luas pálidas,
luas brilhando sobre
cidades desconhecidas
e um caso para relembrar
e esquecer,
e novo tempo de partir
e o que será, será,
as luzes da cidade
refletindo
um sorriso na lembrança,
um certo sorriso de verão,
cerca de meia-noite,
um sorriso de velhos amigos
embora estranhos no paraíso,
e esse sorriso reacendeu
minha velha chama:
eu dançaria a noite inteira
de rosto colado,
dançando no escuro
canções de setembro,
dançando na chuva,
nas areias da maré baixa,
mas você ainda não estava
dançando a melodia imortal,
você era uma estrela
piscando acima do arco-íris,
e de repente havia fumaça
em seus olhos,
amores clandestinos,
minha garota melancólica,
até nosso reencontro,
mas depois daquela última dança,
corpo e alma,
nunca mais seremos os mesmos.

Hoje a canção é você
e eu estou feliz
por ser infeliz nessa fascinação
entre folhas mortas,
gardênias azuis,
serenatas ao luar,
canções da Índia,
cartas de amor...
With a song in my heart
eu te esperei vinte anos,
acordado e triste,
no salão silencioso e apagado.
Você mudou, noite e dia,
mudou suave e adoravelmente,
e ainda tem os mesmos olhos,
olhos de mulher apaixonada,
olhos de Malu Mader,
e agora, por causa de você,
por tudo que você é,
eu posso finalmente sonhar
que durante todo esse tempo
você não flertou com ninguém,
e que olha só para mim,
meu amor,
meu par.

Aldir Blanc: A poesia que é música duas vezes

Aldir mistura a tradição que começa com Catulo, passa por Orestes Barbosa e Caymmi, chega a Vinícius e desemboca em autores modernos como Fátima Guedes, Cazuza e Renato Russo.

A resposta que Aldir dá ao tempo é exatamente a sua permanência no tempo. Num país com típica cultura de superfície, como o Brasil, vencer essa superficialidade não uma ou duas vezes, não um ou dois anos – mas mantendo-se por mais de 30 como respeitada unanimidade quando o assunto é a qualidade literária dentro da MPB, convenhamos, isso não é para qualquer um [leia mais]

Este poeta carioca, fez parte do MAU (Movimento Artístico Universitário), que revelaria à música nomes como Ivan Lins, Gonzaguinha e Guinga. Ficou célebre através de sua parceria com João Bosco, que rendeu sucessos como “Linha de Passe”, “Mestre Sala dos Mares”, “Incompatibilidade de Gênios” e “Kid Cavaquinho”. Começou a compor com 16 anos, e acumula uma extensa obra, gravada por alguns dos principais artistas da música brasileira, como Elis Regina, Djavan, Edu Lobo e Simone. Membro politicamente ativo da classe artística, participou da Sombras, sociedade responsável pela defesa dos direitos autorais, além de ajudar a criar a SACI (Sociedade de Artistas e Compositores Independentes) e da AMAR (Associação dos Músicos, Arranjadores e Regentes). Cronista talentoso, Aldir publicou diversos livros com destaque para “Brasil Passado a Sujo” [leia mais]

Aldir Blanc é também autor de livros, entre eles: "Rua dos Artistas e Arredores" (1979), "Brasil Passado a Sujo" (1993), "Vila Isabel - Inventário de Infância" (1996) e "Um Cara Bacana na 19 ª" (1996).

Este post faz parte da blogagem coletiva “Abra Aspas” para a poesia no seu blog… promovida pela Lunna Montez'zinny Guedes do Acqua. Para participar, escolha uma poesia para postar e fale um pouco do poeta. A intenção é deixar a blogosfera mais poética. Inscreva-se e participe!

[update] - 06:37hs - Ontem não consegui comentar em todos os blogues, mas li todas as postagens. Concluindo: O antigo e o novo caminharam juntos muito bem, conheci novos poetas e poetas antigos. O melhor da festa? Os blogueiros poetas, lógico!

Rapidinhas, para começar a semana 1 [update]

“Por vezes, ao acordar, sinto que a minha alma não cabe no corpo.
Sinto que o corpo me aperta a alma, sei lá, que está curto, entendes?, como se tivesse adormecido com 15 anos e acordasse aos 25 ainda com a mesma roupa.
Sinto uma grande vontade de despir este corpo e ficar com a alma exposta, inteiramente nua.”
(“Manual prático de levitação”, José Eduardo Agualusa)


That’s a passionate kiss !

O site EverybodyLovesKiss faz uma deliciosa compilação de fotos recolhidas do Flickr com a tag kiss. Original!

Kiss me, baby! Boas intenções!

"Quem era aquela que te amou no sonho, enquanto dormias?" pergunta de Pablo Neruda, pseudônimo de Naftalí Ricardo Reyes Basoalto. Prêmio Nobel de literatura em 1971. Morreu em 23 de setembro de 1973 - "Em que janela fiquei olhando o tempo sepultado?" outra pergunta de Neruda.

"O Livro das Perguntas", de Pablo Neruda, edição em português da CosacNaify (R$ 45,00) lançada recentemente com tradução de Ferreira Gullar e 87 ilustrações de Isidro Ferrer - reproduzidas por meio de fotografias e encomendadas pela editora espanhola Media Vaca, em 2006 - tem edição de bolso pela L&PM (R$ 12,00), para quem não faz questão das ilustrações e quer apenas ler a poesia de Neruda, com tradução de Olga Savary.

Vejam a diferença do preço e não querendo desprezar o trabalho artístico de Ferrer, apenas incentivando a compra/venda de livros mais acessíveis - a L&PM possue versão pocket - livros menores que cabem na bolsa e mais baratos, que podem ser carregados pra lá e pra cá, aproveitando melhor o tempo em filas, salas de esperas ou meios de transporte.

Fica a sugestão de leitura, uma obra dedicada ao público infanto-juvenil, mas que nada impedem os adultos de acatá-la.

Leia os conselhos práticos de crianças que entraram em contato com a obra:

"São tantas dúvidas que desconfio que não sejam para a gente responder. Acho mesmo que são para pensar", Nina (10 anos).

"Pablo Neruda era muito feio (...) Para não se entediar, deu para escrever poemas" Arthur (9 anos).

Além das aparências, temos a beleza da vida - da poesia, no caso de Neruda, democrática!

"Porque se suicidam as folhas quando se sentem amarelas?"



Como estamos falando de boa leitura, faço um convite em nome de Marcos Pontes, do Simpatia e Esculacho, para o lançamento de D'Acolá, seu último livro, em São Paulo. Vocês leitores do "Simpatia e Esculacho" ou não leitores que queiram conhecer Marcos Pontes, apareçam no Boteco Ferraz no próximo dia 23 de Outubro às 19 hs. e dêem um beijuzinho nele por mim, já que não poderei estar presente. Prestigiem o nosso amigo blogueiro!

O livro pode ser adquirido pela editora "Os Viralata" ou encomendado diretamente no blogue "Esculacho e Simpatia" - essa segunda opção te dá direito a uma dedicatória exclusiva!

[update] - Segue e-mail do amigo blogueiro Manoel Carlos:

"Infelizmente Sílvia faleceu esta noite, dormindo. Amanhã será realizada a cerimônia de cremação, das 12h30 das 13h30 no forno crematário do Caju. É o terceiro portão, de quem sai da Avenida Brasil (o primeiro é o do Memorial do Carmo, o segundo é do Cemitério Israelita, o terceiro tem uma placa indicando forno crematório.).
Fraterno abraço
Manoel Carlos"


Quem puder comparecer e apoiar Manoel em suas últimas homenagens à esposa, fica o comunicado. Este blogue se solidariza e ficará de luto durante esta semana.

Boa semana!
Beijus,

A estupidez humana



Nas fábulas do LaFontaine, as hienas e os abutres fazem um acordo para repartir a carniça em vez de se auto-destruir, isto porque:

o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.

o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.

o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.

o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.

o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.

o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.
o inferno é os outros. o inferno é os outros.


Todo mundo aqui sabe que a frase "O inferno é os outros" é de Sartre, certo?

"Vocês estão vendo aquela mulher de cabelos brancos
Vestindo farrapos, calçando tamancos
Pedindo nas portas pedaços de pão?
A conheci quando moca,era um anjo de formosa
Seu nome é Maria Rosa, seu sobrenome Paixão
Os trapos de sua veste não é só necessidade
Cada um para ela representa uma saudade
Ou de um vestido de baile, ou de um presente talvez
Que algum dos seus apaixonados lhe fez
Quis certo dia Maria por a fantasia dos tempos passados
pôr em sua galeria uns novos apaixonados
Essa mulher que outrora a tanta gente encantou
Nem um olhar teve agora, nem um sorriso encontrou
Então dos velhos vestidos que foram outrora sua predileção
Mandou fazer esta capa de recordação
Vocês, Marias de agora, amem somente uma vez
Pra que mais tarde essa capa não sirva em vocês."
(Maria Rosa - de Lupicínio Rodrigues e Alcides Gonçalves)

* Não só as Marias, os Joãos também!

Álias, a blogosfera de maneira geral, precisa renovar os hormônios. Muita gente soltando faísca, gastando muita energia com pouca coisa. Uns intolerantes. Como diz minha mãe "Um tanque de roupa suja cai bem" - mas lavem em casa, viu?

”Pra quem não sabe nadar, marola é tsunami” by
Guga Alayon aka Googól

Bom fim de semana!
Beijus,

A Globalização e o ralo [update]


Os binóculos não tinham sido inventados e, apesar de próximas, separadas por um rio, as duas tribos se ignoravam. Seus limites eram os limites do mundo. Uma, previlegiada por imenso pomar natural, vivia de mangas, laranjas, mamão e abacates. A outra se alimentava de cenouras, nabos, rabanetes e mandioca. Estavam tão separadas, naqueles idos, quanto hoje os habitantes da terrra e supostos alienígenas de Andrômeda.

Certo dia, numa daquelas tempestades terríveis, um raio derrubou a grossa árvore postada bem na margem onde o rio era mais estreito, formando uma ponte natural. Um daqueles menininhos de dois ou três anos, desgrudando-se da mãe, atravessou para o lado oposto. Levava uma penca de mangas pela mão. Por coincidência, encontrou outro menininho da mesma idade, também desgarrado, com um monte de cenouras. Não demorou mais de um minuto para que, sentados na mesma pedra, dividissem a refeição. O das cenouras extasiou-se com as mangas. A recíproca foi verdadeira.

Logo os adultos, seguiram as crianças e, milagres dos milagres, aqueles nossos ancestrais passaram não apenas a comer melhor, mas inventaram a palavra mágica: começaram a gritar "Globalização, globalização"...


Um corte nesta história nos leva a 1453, quando os turcos tomaram Constantinopla. Em poucas semanas interrompeu-se o fluxo das bissextas caravanas que, saindo da Europa, às vezes conseguiam chegar à Índia, Mongólia e até a China. Quem se aventurasse era passado pela espada otomana, até os camelos, e os europeus não tiveram outro remédio senão lançar-se ao mar. Descobriram o caminho das Índias, as caravelas chegaram ao extremo oriente. A mesma palavra mágica ecoou nas gargantas dos heróicos navegadores e dos misteriosos potentados de pele escura ou amarela: "Globalização, globalização".

Assim como para os trogloditas o mundo se tinha tornado outro, maravilhoso, definitivo, pronto e arrumado, porque podiam trocar mangas por cenouras, da mesma forma o comércio com especiarias, de um lado, e madeira, de outro, acabava de alterar costumes, cultura, modo de viver e de pensar. Nada mais haveria de novo, a Humanidade chegara aos píncaros de sua existência, era preciso reformular definitivas teorias políticas, econômicas e filosóficas em condições de exprimir a síntese final. Quem não as aceitasse podia escolher entre ser chamado de retrógrado ou ir para a fogueira.

Pois é. Tanta pressunção de nossos ancestrais se desfazia séculos a séculos, mas não adiantava. Para os donos do poder de cada momento não haveria mais nada para aventurar, descobrir, inventar e até pensar. A civilização estava concluída através da mesma palavra mágica: "Globalização, globalização".


Hoje, os netos daquela gente precipitada andam festejando outra vez porque a Alemanha fabrica motores, a Argentina, bancos de couro, a Coréia, baterias, e a Malásia, pneus, para que, com o aço fabricado no Brasil, os operários mexicanos possam montar automóveis que os japoneses vão copiar e os americanos, comprar.

Acabou a história, pela milésima vez. Não há mais o que imaginar, discordar ou questionar. Está o mundo completado, definido, arrumado. Por conta desse novo capítulo fluem as novas e agora definitivas teorias diante das quais a ninguém é dado duvidas, todas demonstrando que será assim até o fim dos tempos. Outra vez engessa-se o pensamento, obrigando a aceitar como realidade eterna a supremacia do mercado, a livre competição entre quantidades desiguais, as privatizações desmedidas, o enfraquecimento do Estado e, em contrapartida, a prevalência do mais forte sobre o mais fraco, o desemprego estrutural e inevitável, a transformação do assalariado em peça descartável, a divisão das sociedades entre a minoria rica e previlegiada e a maioria pobre e submissa. Se quiserem, até, a supressão das nações diante das empresas multinacionais. Nada existirá depois desse modelo da globalização.

Tolos ou velhacos? Quem garante que daqui a cinqüenta anos não estaremos trazendo minerais nobres de Marte, água de Vênus ou gás de Júpiter? E se em quinhentos ou mil anos pudermos importar cérebros da Ursa Maior, ou o plasma vida eterna, da Constelação de Sagitário?


De toda essa paranóia, apenas uma conclusão: parem de enganar os trouxas e de estabelecer dogmas. Até porque, as eleições estão em reta final. E se não for no ano que vem, será nos próximos, a demonstração de que a vida não se reduz à troca de mangas por cenouras.

Carlos Chagas é apresentador do programa Jogo do Poder da CNT, escreve uma coluna publicada em 12 jornais, comenta e critica a forma como a imprensa brasileira vem atuando. No cenário político defende o fim das medidas provisórias, a fim de que o poder legislativo possa cumprir suas funções constitucionais.
Quero homenagear esse jornalista que no dia 02 de Outubro completou 50 anos de profissão e nada mais justo trazer à tona um texto escrito em Agosto de 1997 que não esteja publicado na mídia, reconhecendo o pioneirismo de um ícone do jornalismo e de credibilidade pública.

Agradeço o colega blogueiro Herbert Drummond por ter me lembrado da data. Fica o conselho do mestre:

"O jornalista não é melhor nem pior do que o escritor, mas precisa de conhecimento ordenado e sistematizado, que só adquire na faculdade. Antes, aprendíamos apenas pela experiência, a prática. Só quem sabe história, filosofia, economia, geografia, pode ser um bom jornalista. Bem como precisa conhecer a parte técnica: editar, diagramar, apresentar, aprende-se com muito mais facilidade e eficiência nos bancos universitários" [em entrevista]

Pelo jeito muitos jornalistas precisam comer muita mangas, laranjas, mamão, abacates, cenouras, nabos, rabanetes, mandioca...

[update]
Mesmo como nota póstuma a publicação do texto, dizendo ser o mesmo obra de ficção; lamentavelmente, qualquer semelhança com a realidade não é mera coincidência, porque assédio e violência sexual são crimes freqüentes no Brasil e como tais não deve ser incentivado a prática. Deixo aqui registrado o meu repúdio e como tais, devem ser repelidos, denunciados, combatidos e debatidos. Como Goldman escreve, “Só me permito lembrar – lavando panos sujos assim tão publicamente – porque o mundo é cheio de Luisas”. Esse escritorzinho não é mais ridículo porque a revista não lhe disponibiliza mais espaço. Um escritor 'de ficção' de quinta categoria. 

Beijus,

...em quietude, sem solidão

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