E agora começa a anoitecer tão cedo. (…) Janelas iluminadas e eu a imaginar as vidas atrás das cortinas, por vezes, num intervalo, um relógio, uma pagela, um lustre que me assusta, vultos.
Gestos femininos bonitos sempre, a delicadeza com que as mulheres tocam nos objetos, a harmonia dos dedos: somos pesados e sem graça, nós os homens, ao pé delas. Pesados, brutos, canhestros: não possuímos seja o que for de ave ou de nuvem, a nossa carne é densa e gaguejante.
Dá-me uma paz de eternidade ver uma mulher numa casa, o modo como o seu corpo habita o espaço, a forma como vestem, de si mesmas, os compartimentos, com um simples passo, um simples olhar.
Imagens:
Gregory CrewdsonTexto: "Eu, às vezes", António Lobo Antunes, Revista Visão de 13 de Dez.07, pag. 10
O que há por detrás das fachadas? Da metáfora dos estados?A
fotografia de Gregory Crewson é ligeiramente perturbadora, um trabalho que se aproxima muito mais do cinema que da fotografia, com cenários estudados, construídos,
mise en scene que se esgota na estratégia de produção; sua equipe conta com um designer de set, um iluminador, um diretor de arte e um diretor de fotografia, que de modo subtil, questionam o conhecimento que temos da realidade.
Fica o pensamento para início da semana:
"Para a mentira ser segura e atingir profundidade, deve trazer à mistura qualquer coisa de verdade" (Antônio Aleixo)[update]Pessoal, está me incomodando alguns comentários a respeito desta frase acima, como se eu aceitasse a "mentira social". A frase foi citada, porque se encaixa muito bem dentro do contexto do trabalho lúdico de GC. As imagens no caso, seriam mentiras criadas que ao atingir o seu intento, pela manipulação perfeita passam a idéia de verdade, de uma existência real.
[/update]Boa semana!
Beijus,