Rock (n'roll) blues

E se não tivesse dado certo?



Os americanos inventaram três coisas que revolucionaram o século: o automóvel, o cinema e o rock’n’roll. Pode-se dizer que nenhuma destas criações foi autenticamente americana.

O cinema, curiosidade iniciada pelos irmãos Lumière, se firmou como divertimento de massa graças aos grandes produtores de Hollywood (e os franceses tiveram que reimportá-lo no pós-guerra.)

O rock’n’roll também não passava de uma musica feita por negros para negros, sob o nome de rhythm & Blues, mas foi preciso um branco para transformá-la no som do século. Elvis cantava uma versão envenenada de um destes blues (It’s all right, Mama, de Arthur “Big boy” Crudup) quando foi descoberto em um estúdio de Memphis numa tarde de verão de 1954.

Sam Philips, da Sun Records, vivia dizendo: “Se eu pudesse encontrar um branco com o som de um negro e o sentimento de um negro eu faria milhões de dólares”. Aquele branco de alma negra que ele buscava desesperadamente era Elvis.

O Rock’n’roll estourou nas paradas em 1955, na semana em que Rock Around the Clock de Bill Haley & Hits Comets desbancou o número um das paradas, o mambo Cerejeira Rosa, de Perrez Prado. O primero hit de Elvis foi Heartbreak Hotel, que chegou ao primeiro lugar nas paradas em Março de 1956.

O Rock’n’roll era uma espécie de fusão entre o rhythm & blues negro com o Country & Western, temas folclóricos criados pelos pioneiros da colonização americana ou herdados da tradição européia. Mas tudo o que Elvis fazia se tornava tão americano como torta de maçã, até uma canção chamada “It’s now or never”, que nada mais era do que a versão em inglês do velho sucesso napolitano O Sole Mio.

O mito sobrevive a tudo. Elvis nadou contra a corrente do seu tempo. Foi caipira, machista, militarista, reacionário. Os fãs perdoaram tudo isso. Muito antes da ovelha Dolly, o mundo foi povoado por clones de Elvis. Morto, tornou-se objeto de um verdadeiro culto, que transformou a mansão de Graceland numa espécie de Lourdes do rock’n’roll, surgiu finalmente o que estava faltando: um milagre. Na cidadezinha holandesa de Deurne, o fã e clone Toon Nieuwenhuisen está exibindo, para milhares de visitantes, uma estátua de Elvis que chora. O Mito ganha status de Santo.

Elvis gravava até 30 vezes a mesma música, antes de ficar satisfeito. Algumas vezes tocava bateria e acordeão. Para manter a fama de garanhão, ele deixava-se fotografar sempre em poses sedutoras ao lado de garotas, mas atrás dos palcos o rei era um destruidor de corações. Seus discos venderam mais de 100 mil cópias em todo o mundo após a sua morte em 16 de agosto de 1977 e até hoje o rei sobrevive através de jovens que consomem Elvis de formas variadas. Os filmes andam repletos de referências, Covers de seus sucessos são gravados e livros são escritos por parentes, amigos e pesquisadores.

Ele era apenas um garoto pobre que gostava de carros, armas e Jesus – não necessariamente nessa ordem. Nasceu em uma quase choupana, nos cafundós de uma quase cidade, Tupelo, Mississipi. Os EUA ainda sofriam os efeitos da depressão. E, para Vernon e Gladys Presley, ela grávida de gêmeos, a situação era desesperadora.

Elvis Aron Presley nasceu em 8 de janeiro de 1935, em meio a dor de seus pais: seu irmão nasceu morto. A tragédia transformou Elvis em um filhinho da mamãe. Até os 13 anos, ele e sua mãe dormiam na mesma cama. Vernon, o pai, cumpria pena de três anos de prisão, desde 1938, por ter adulterado em dois dólares um cheque de seu patrão. Apenas para comprar comida. Até a sua ida para o Exército, em 1959, Elvis e Gladys nunca haviam passado um dia longe um do outro. Foi Gladys Presley, na verdade, quem começou a zorra toda. Elvis, adolescente, queria comprar um revólver. Sua mãe o convenceu a comprar um violão. Veja como uma escolha pode mudar uma vida! ...ou várias vidas!

A história da música provavelmente também teria sido diferente se Marion Keisler, secretária do Sun Records Studio não tivesse ido trabalhar naquela manhã em 1953. A especialidade do estúdio era gravar música negra. O caminhoneiro Elvis, meio louro – o cabelo preto, sua marca registrada, era pintado -, foi gravar um disco modestamente vestido com sua calça jeans, e resolveu gravar That’s all Right (Mama).

A música caiu nas graças do público. Era um branco cantando música negra ou um negro que cantava como um branco? E logo o mundo curvava os quadris dançando o ritmo do momento. Assim, brancos e negros, irmanados pela primeira vez na história dos EUA, curtiram juntos o novo som.

A lenda também diz que o bluseiro Robert Johnson vendeu a alma ao diabo em uma encruzilhada. Elvis vendeu a sua voz para o ganancioso empresário Tom Parker. Ele, que se intitulava Coronel, começou a sua pintando passarinhos de amarelo para vender como canários. Induziu Elvis a assinar um contrato vitalício.

Dizem que quando Elvis morreu, seu único comentário foi: “Isso não vai mudar nada”. Por sua influência, Elvis, logo descoberto por Hollywood, começou a fazer comédias açucaradas e, como ele mesmo considerava, meio abobalhadas. Mais do que ser um galã que cantava. Elvis desejava ser um ator dramático. E viu Juventude Transviada mais de 50 vezes para aprender os macetes de James Dean. Sua única grande chance foi o cult King Creole, dirigido por Michael Curtiz. Saiu até no New York Times: “Elvis é Marlon Brando tocando guitarra!”

Logo que começou a ganhar muito dinheiro, comprou uma mansão para os seus pais. Os vizinhos reclamavam da gritaria dos fãs e dos varais no jardim. Com as constantes reclamações, os Presley se mudaram para um endereço mais recluso e compraram uma mansão situada em 13 acres. O culto à Elvis ganhava o seu santuário, Graceland, a terra da graça.

A casa é a segunda mais visitada do planeta. Só perde para a Casa Branca. Cerca de 750 mil mortais visitam o local anualmente, deixando lá 17 milhões de dólares. No aniversário da sua morte, é esperado quase o dobro, sempre. Está quase tudo lá, desde a sua coleção de carros, roupas e guitarras até os incontáveis discos de ouro, honras, glórias e sempre presença dos fãs.
Na sala de estar, três televisores. Elvis assistia três canais ao mesmo tempo. Inclusive quando recebia para jantar, em trajes de gala, seus convidados. Era uma babel que ia de artistas e políticos a antigos amigos dos tempos de penúria. E sempre a máfia de Memphis, como eram chamados os amigos mais chegados. À mesa todos eram iguais.

É possível entrar nos seus dois aviões, com pias de ouro maciço. Uma vez ele voou até Denver, Colorado, só para comer um hambúrguer especial. Preço da noitada: 16 mil dólares. Por outro lado, na sala de jogos há uma mesa de bilhar que continua rasgada e remendada por uma fita durex.

O ponto culminante da visita é o jardim da meditação, onde Elvis e seus familiares estão enterrados. Lá todos choram, oram, deixam bilhetes, ursinhos de pelúcia e juram amor eterno.

O aniversário de sua morte pode ser uma das ultimas oportunidades de conhecer a mansão. Lisa Marie, sua única filha, declarou que vai para lá encontrar as suas raízes. Ou então buscar o tesouro que, dizem, seu pai enterrou nos jardins com medo de ser, mais uma vez, roubado pelo coronel Parker.

O rei podia ter a mulher que quisesse na cama ou no banco traseiro do Cadillac que escolhesse. No seu caderninho de emergências constava, entre conhecidas e desconhecidas, os nomes de Marilyn Monroe, Nancy Sinatra, filha do cantor, Nathalie Wood, e até a gata Cybill Shepherd, antes de fazer sucesso. Ursula Andress foi esnobada porque “além de ser casada, tem os ombros mais largos que os meus”, disse Elvis. hahahaha Elvis podia esnobar!

Durante os três anos que serviu o Exército, em uma base na Alemanha, Elvis namorava a bela Priscilla Beaulieu, 14 anos, filha de um oficial. Quando voltou aos EUA, em 1962, conseguiu convencer, sob a promessa de casamento, o pai da donzela e a levou para Graceland. Foram anos e anos de “pecadinhos”. Mesmo assim Priscilla continuava virgem. Elvis a queria pura. Com ela nada, mas com as outras tudo. Priscilla ia ao colégio enquanto o rei excursiona e transava pelo país afora.

Em 1963, Elvis foi para Lãs Vegas filmar com a Starlet sueca AnnMargret. No deserto, tudo aconteceu. Elvis, apaixonado-se pela linda atriz de 22 anos e pensou até em casamento. Mas como desfazer a sua promessa à Priscilla? Elvis era um cavalheiro e tinha que honrar o compromisso.

Coração partido, o rei chora as suas mágoas na guitarra e, numa cena que mais parece coisa de cinema, diz adeus e volta para os braços de Priscilla.

O casamento só aconteceu em Maio de 1967. Nove meses depois, Lisa Marie nasceu. Os anos rebeldes também. O País assiste ao Verão do Amor em São Francisco, pedra filosofal do movimento hippie. Bob Dylan tinha avisado há anos que os tempos estavam mudando e as respostas estão sopradas no vento.

Pai Elvis se fecha em Graceland de onde só sai para excursões quando o dinheiro fica curto. E começa a ser esquecido pela mídia. O rei em seu castelo se entope de hambúrgueres, sorvetes, carnes de porco e muito colesterol. Em 1972, Elvis e Priscilla se divorciam apesar dos apelos de Lisa Marie.

Para o seu público ele ainda é rei. Em 1973, depois de uma dieta ele se apresenta em sua melhor forma no concerto Alowa From Hawaii. Quarenta milhões o assistem via satélite, mais do que a audiência da chegada do homem à lua.

É seu canto do cisne. Depois, ele mergulha na depressão, volta a engordar, toma pílulas pra tudo. O sonho americano se transforma em drama shakespeariano. A grande tragédia anunciada mostra a sua cara. Os arquivos da polícia de Memphis mostram que Elvis morreu no Hospital Batista no dia 16 de Agosto de 1977, às 3:30 da manhã, depois de sofrer um ataque cardíaco em seu banheiro, enquanto lia um livro sobre Jesus. Outros afirmam que Elvis não morreu e que sua morte foi apenas um plano fantástico para recomeçar uma nova vida.

Em sua lápide, seu nome do meio, Aron, está escrito com um “a” a mais, Aaron, com quem diz “Não sou eu que estou aí”. Um anagrama de Elvis é Lives (vive).

Outros dizem que ele estava vivo o tempo todo, mas teve um colapso e morreu quando soube que a sua filha tinha se casado com Michael Jackson.

Numa cena do filme, Homens de Preto, o ator Tommy Lee Jones diz que Elvis é um alien e simplesmente voltou pra casa.

Piadas e conjecturas de tablóides sensacionalistas à parte, a verdade é que enquanto, garotos e garotas de qualquer idade, que amavam os Beatles e os Rolling Stones, continuarem rebolando nossos quadris ao som de um rock, ou arrepiando a pele com uma canção que nos lembra um amor passado, presente ou impossível, Elvis estará vivo.

E eu hoje exorcizei a vontade que tinha de escrever um texto sobre Elvis, desde que este blogue surgiu. Verdade que não gosto muito de Elvis, mas ele me provoca nostalgie - Quando cheguei ao Rio morei em um lugar, que à época era de ouro em Ipanema e todos os velhinhos que moravam no prédio participaram disso, eram os prafrentex e eu nem tinha nascido. Eu dei de escutar Elvis, achei que pudesse agradar a vizinhança, mas... eles formavam uma grande comunidade, estavam ali a long, long time e ensaiaram um coro "Museu". Essa palavra repercutiu no vão central, de uma maneira que quando chegou no topo, meus cabelos arrepiaram. Agora eu só escuto Elvis quando sinto saudades das "meninas". Saudades, muitas saudades!

13 comentários :

  1. Querida Luma, seu texto sobre o Elvis contou a verdade sem menosprezar a fantasia que "ele" criou nas cabecinhas de muita gente... Ah, e sobre a parte do violão ou arma? Às vezes um detalhezinho muda nossas vidas!

    Beijos e bom domingo.

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  2. Seu texto é muito bom e bem completo.
    Vim ao seu blog por meio do tecnorati.
    www.blogdocatarino.com

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  3. oiii!!!
    Luma ,
    o rock n'roll é interessante, justamente pq ele é a mistura entre culturas, tanto que pra muita gente Elvis "não morreu"
    muito bom seu post.
    Bjs...bye!!!

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  4. Que texto lindo, Luma!!!!
    Só te digo uma coisa: Elvis não morreu!!!

    Beijos!!!

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  5. Também nao curto muito o Elvis, é verdade, mas que nostalgia sinto quando para para ouvi-lo. Depois desta aulinha de Elvis, fiquei com ganas de ouvir!

    Luma voltei neste endereço: www.renovidade.blogspot.com

    Bj. INté!

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  6. Texto perfeito! Muita paixão, contextualização e riqueza!

    =*

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  7. Anônimo11:01

    Off-topic: que novidades que eu nõ contei, Luminha? Não entendi. :-) Beijo!

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  8. Adorei o texto, Luma. O rock n'roll se popularizou nos EUA por causa de Elvis mesmo, mas segundo uma deliciosa pesquisa que fiz pra um curta documentario sobre o rock e a historia dos EUA, ele jamais foi sua verdadeira alma. Chuck Berry sim.

    Nunca gostei de Elvis e ate hoje, sinceramente, nao gosto. Alem de seus valores hipocritas, nunca achei que ele tivesse algo de tao especial, mas reconheco sua importancia ao rock n'roll.

    De todos os modos, perfeito o texto!

    bjx

    RF

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  9. Nunca gostei do Elvis não mas, nãp posso deixar de reconhecer que o cara é um fenomeno até hoje. Como sempre, um posto muieo bem escrito, coisa que lhe é peculiar, né amiga?

    Otima semana

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  10. Eu disse que vim ao seu blog por meio do technorati, você tem um perfil lá.

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  11. Luma...adorei seu post....Amei, pra falar a verdade!
    Tudo ligado a musica, sou apaixonada....coisa de mulher de 30 e poucos ne?
    Linda, obrigada pela visita no meu site...Pois e, to sumida, pq estou trabalhando muito...Arrumei um emprego em um banco aqui em Zurique e que esta me tomando o dia e a noite e fins de semana tbm, mas, ta bom, lutei pra isso, agora tem que dar conta..rsrsr
    E quanto ao seu comentario...pois e, vc nao é um ima não..é que no mundo de hoje, existem muitas pessoas que sao muitas vezes, incompreendidas, então...qdo elas encontram alguem com um ombro pra se encostar, elas se sentem em casa...
    Beijos linda e se cuida...

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  12. Oi Luma.
    Gostei do texto e da trilha sonora. Rock é nosso tempo, rock n'roll é isto: Elvis e Chuck Berry forever.
    Beijo.Boa semana

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  13. Gostei do texto, e amo Elvis.

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